Igrejas modernas,
“feias como o pecado”
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Igrejas tradicionais, antecâmaras do Céu
Para arquiteto
americano, muitos sentem, mas poucos dizem: as igrejas modernas criam um
ambiente que leva à perda da fé. Em sentido contrário, as igrejas antigas,
fiéis à tradição, estimulam a fé e a piedade, tornam atraente a virtude e
alimentam o desejo do Céu.
Luis Dufaur
Por certo o leitor já terá visto igrejas católicas
em estilo moderno ou modernizado, ou mesmo entrado em alguma delas. Que
impressão causam? Para muitos, as formas e estilos artísticos não tradicionais
causam mal-estar psicológico. Por isso, não raramente lamentam-se, e confessam
ter saudades dos estilos antigos. Se o leitor conhece gente assim, ou é um
deles, encontrará aqui algo que lhe explicará muitas coisas.

Faltava a
publicação de um estudo que apontasse com clareza, conhecimento, seriedade e
respeito o que a nova arquitetura católica tem de censurável. Michael S. Rose,
jovem arquiteto americano, doutor em Belas Artes pela Brown University (dos
EUA), pôs o dedo na ferida. E a repercussão foi vasta. Seu livro, Feia como o
pecado — Por que transformaram nossas igrejas de lugares sagrados em salas de
reunião, e como voltar atrás(1), tornou-se leitura de referência. Na esteira
desse sucesso, o autor publicou Em camadas da glória: o desenvolvimento
orgânico da arquitetura das igrejas católicas através das épocas(2) e entrou na
lista dos best sellers do “New York Times”.

No texto que segue,
o primeiro livro será citado com a letra U (de Ugly, feia), seguida do número
da página. E o segundo livro será citado com a letra T (de Tiers, camadas),
também seguida pela página correspondente.
Ambiente
arquitetônico influencia tendencialmente os fiéis
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Embora Dr. Rose
seja católico, escreveu sua obra do ponto de vista de um arquiteto. Identificou
os princípios e usos que guiam os profissionais quanto à feiura arquitetônica
religiosa moderna. Vasculhou na tradição e na história da Igreja as razões
pelas quais um templo é católico independente de estilos, escolas e eras
históricas. Encontrou um tesouro de doutrinas — algumas reveladas por Deus, e
muitas outras elaboradas pelo Magistério tradicional da Igreja.
Constatou que os
fundamentos dos estilos católicos para construir igrejas ao longo de dois
milênios foram contestados e expulsos pela nova arquitetura eclesiástica. Não é
uma divergência de gostos, preferências, comodidade ou custos, segundo o autor.
Trata-se de uma oposição medular entre dois modos de considerar a ordem do
Universo, da Redenção e da Igreja, aplicados à arquitetura.
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As duas concepções
passam mensagens antagônicas, através de formas estéticas, cores, proporções,
num sem-número de elementos simbólicos materiais. Elas modelam o modo de
sentir, de praticar e de aderir à fé e atingem algo muito íntimo: o próprio
modo de ser de quem frequenta as igrejas.
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Dr. Rose timbra em
ressaltar: “Um postulado básico que os arquitetos aceitaram durante milênios é
que o ambiente arquitetônico tem a capacidade de influenciar profundamente a
pessoa, o modo como ela age e sente, o que ela é” (T, 9). E acrescenta: “A arquitetura
da igreja afeta o modo mediante o qual o homem pratica o culto; o modo de
prestar culto afeta o que ele crê; e o que ele crê afeta não somente sua
relação pessoal com Deus, mas o modo como se comporta na vida diária” (U, 7).
Como isso acontece?
Rose o mostra, historiando a origem de ambas concepções.
Fidelidade
das igrejas antigas às origens bíblicas e canônicas
O arcabouço do
templo católico foi ditado por Moisés durante a travessia do deserto. Ele
mandou que os judeus demarcassem nos acampamentos um espaço retangular sagrado.
Numa extremidade era montada a tenda, ou tabernáculo, que continha a Arca da
Aliança com as Tábuas da Lei. Diante da tenda, erigia-se o altar do sacrifício.
Este esquema guiou a construção, pelo rei-profeta Salomão, do Templo de
Jerusalém, completado em 966 a.C.
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Durante as
perseguições romanas, os primeiros cristãos foram constrangidos a se
congregarem em casas ou nas catacumbas. Quando obtiveram a liberdade em 313,
com o edito de Milão, do Imperador Constantino, eles escolheram para suas
igrejas os altos, ricos e imponentes edifícios chamados basílicas. Eram as
construções mais próximas do Templo ideal. Possuíam cinco naves e uma abside
reservada para os magistrados, a qual apresentava o chão elevado. Os cristãos
acrescentaram um transepto para que a planta do edifício formasse uma cruz. No
cruzamento dos braços da Cruz instalaram o altar. Em Roma, podem-se visitar
algumas das mais famosas dessas basílicas, como a de São Paulo fora dos Muros,
São João de Latrão e Santa Maria Maggiore. [foto 1]
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Essas basílicas
cristianizadas constituíram o ponto de partida do estilo românico. Neste, o
teto plano foi substituído pelos arcos de meio ponto que nos remetem à abóbada
celeste. Surgiu depois o estilo gótico, com a ogiva que acena para alturas
infinitas. Ele é hierático, sacral e solene; lógico, matizado e requintado; um
resumo da ordem do Universo.
O estilo barroco
deu ênfase ao movimento, às cores e à estatuária, manifestando aos fiéis a
proximidade do mundo sobrenatural com o terreno. Luminoso, cálido e acolhedor,
contrapôs-se à visão do protestantismo: ressequida, hirsuta, cinzenta e
utilitária. Podemos apreciá-lo em inúmeras igrejas coloniais brasileiras. [foto 2]
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O século XIX
misturou os estilos, e até viu renascer o gótico. A variedade foi pasmosa, mas
o espírito e o ambiente das igrejas católicas continuou sempre marcado pelo
recolhimento, a sacralidade e a unção sobrenatural, sinais da aprovação divina.
Esta continuidade, explica o autor, deve-se a que todos eles respeitaram os
princípios da tradição arquitetônica católica.
Origens
protestantes das igrejas católicas modernas

Na primeira metade
do século XX apareceram igrejas em estilos modernos, desprovidas desse
espírito. Como foi isso possível?
O arquiteto
americano mostra que o protestantismo, estéril por natureza, foi incapaz de
gerar um estilo arquitetônico próprio. Seus heresiarcas fundadores preferiram
galpões sem graça. Porém, os pastores heréticos conservaram antigas igrejas
católicas usurpadas, para se darem ares de credibilidade. É a razão pela qual,
no Brasil, eles construíram alguns templos de inspiração neogótica.

Até que, em meados
do século XIX, um movimento interno no protestantismo reivindicou prédios mais
consentâneos com o seu espírito. Esses templos foram construídos focalizando
leitura e reunião, e não o sacrifício do altar. Eles imitam anfiteatros e
auditórios. Surgiu assim uma arquitetura “deliberadamente não-eclesiástica, sem
altar, sem tabernáculo e sem presbitério” (T, 99).
Tendência análoga
processava-se no modernismo católico. “Após a II Guerra Mundial, os católicos
começaram a experimentar novas formas e configurações. [...] Algumas destas
experiências foram inspiradas pelo movimento liturgicista católico, e dirigidas
por líderes da arte e da arquitetura modernista [...]. A estatuária foi
evitada, a estrutura de basílica foi descartada e o sagrado não foi mais
diferenciado do profano. Utilizando linhas retas e geometrias abstratas,
arquitetos como Rudolph Schwartz e Dominikus Bohm criaram 'espaços de culto'
frios e secos muito antes que estas experiências atingissem o seu auge nas
décadas que seguiram o Concílio Vaticano II” (T, 100-101). Nessas
“experiências”, a piedade e a unção sobrenatural desapareceram.
Le
Corbusier cria igrejas-máquina, ou de pesadelo
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O arquiteto suíço
Le Corbusier criou dois exemplos típicos da nova arquitetura em sintonia com a
nova teologia. “Sua Notre Dame du Haut (1950-1954) [foto 3] em Ronchamp,
França, é talvez o epítome de uma igreja desenhada como uma escultura abstrata.
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O mosteiro
dominicano de La Tourette (1951) [foto 4], [...] com seus
espaços áridos e opressivos, foi um fracasso monumental” (T, 101-102).(3) Le
Corbusier sustentava que a casa é uma “máquina para morar”.
Portanto, máquina,
e não a figura humana, seria o paradigma para a arquitetura. Este critério
insano “foi aplicado na arquitetura eclesiástica católica dos anos 60, enquanto
que a Igreja, desorientada como foi pelo novo movimento litúrgico, sucumbiu à
idéia de que a arquitetura da nova igreja deveria explorar os materiais e os
métodos modernos.
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Então, a maioria
das obras desta época foram efetuadas com aço, vidro e concreto, desenhadas
como grosseiras massas, obedecendo à forma de conchas, navios, arcas e outros
temas náuticos; ziggurats, naves espaciais, colméias, toldos de índio,
artefatos para pouso lunar, e vários tipos de origami” (T, 102).(4)
Entre esses templos
revolucionários, Dr. Rose cita a catedral do Rio de Janeiro. [foto 5] Igreja cônica, algo
sem precedentes no catolicismo, lembra ela os templos babilônicos, dos quais o
maior foi a Torre de Babel (T, 100).
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O autor alude
também à catedral de Brasília — que compara a uma torre para esfriar água — e à
de Maringá, cuja forma cônica reporta-se ao satélite soviético Sputnik, lançado
em 1957. [foto 6]
Protótipos
para o século XXI causam horror
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O desconcerto e o
mal-estar cresciam. Mas o pior estava por vir.
No ano 2000,
segundo o arquiteto americano, três projetos visaram marcar a arquitetura do
novo milênio. O primeiro foi a Igreja do Jubileu 2000, [foto 7] na paróquia
romana em Tor Tre Teste, construída pelo arquiteto Richard Meier. Dela “se diz
que foi concebida pela diocese de Roma como um protótipo para o III Milênio”.
Reúne uma “série de paredes de concreto retilíneas e curvilíneas recheadas com
vidro, todas num plano horizontal, como se o prédio pudesse ser arrancado
qualquer dia e transportado a alguma outra superfície” (T, 104). Para os
críticos, evoca mais a Opera de Sydney ou uma sala protestante perfeitamente
puritana.
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O segundo foi a
catedral de Nossa Senhora, de Los Angeles, EUA. [fotos 8 e 9] Teve-se em vista
uma catedral que “com o seu aspecto grosseiramente volumoso, contrastes agudos,
estrutura assimétrica desprovida de ângulos retos, rompesse deliberadamente com
a continuidade histórica de dois milênios de arquitetura católica para as
igrejas. Mas paga tributo aos últimos cinqüenta anos de estruturas para
escritório, banais e sem inspiração, que têm poluído a paisagem do centro de
Los Angeles e da maioria das outras cidades americanas” (T, 105).
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A terceira grande
experiência foi a Catedral Christ the Light, em Oakland, Califórnia. O projeto
vencedor, de Santiago Calatrava, propôs “uma concha gigante semi-aberta, uma
caixa torácica ou pança de uma baleia. Foi a primeira catedral que iria ter um
teto retráctil. [...] "The San Francisco Chronicle" descreveu a
proposta como 'uma estrutura de costelas de aço pintado, vidro e concreto, que
parece tão futurista como os restos de um esqueleto de uma criatura
pré-histórica corcunda’” (T, 106-107).
Após descrever a divergência existente nas origens das duas tendências, o autor desce aos pormenores das oposições.
Continue lendo o artigo no próprio site da Revista CATOLICISMO:
http://www.catolicismo.com.br/materia/materia.cfm?IDmat=B1D30CD4-3048-560B-1C40426C34447D00&mes=Agosto2006&pag=2
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